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Agora que já arrumei o armário, da minha vida,
aquele onde tenho guardadas todas as emoções e recordações...
estou melhor.
Agora que já falei contigo sem nada esperar de ti,
porque nada queria, a não ser falar,
consegui finalmente arrumar as gavetas e a tua prateleira.
A tua era a mais difícil.
Tu que existes supostamente para me simplificar a vida,
para me ajudar, para me dar a mão, para me pegar ao colo quando cair... tu, deste-me uma carga de trabalhos.
Até para arrumar a prateleira tive que ser eu!
porquê? tu és mais alto e forte!
Não foste tu que a desarrumaste?
Sabes... tinha tudo desarrumado.
Era o amor na gaveta da dor, era a amizade na gaveta saudade...
Quando cheguei à tua prateleira, aquela lá bem em cima da porra do armário, já não sabia que sentimentos lá tinha guardados.
Recordo-me que por lá já passaram o amor incondicional, a admiração, a confiança, a saudade... e que depois de todos esses sentimentos bons, vieram uns maus, que fizeram doer, veio a decepção, a dor, a raiva e por fim a tristeza... a tristeza de saber que tudo poderia ter sido diferente e que nada mais tem remédio, por mais voltas que se dê.
Quando me enchi de coragem e subi o escadote para chegar à tua prateleira, fiquei espantada... pensava que os sentimentos maus, fossem saltar de lá... mas não, ao invés disso, soltou-se uma voz doce, sem medos, nem receios, que conversou comigo, como se houvesse falado ontem, uma voz familiar, uma voz que me deveria ter acompanhado toda a vida... mas que ao invés disso, se fez ausente, durante muitos anos.
Uma voz que me transmitia tanta saudade e que tanta falta me fez...
Agora que estava a falar com a voz que em tempos se negou a fazer-se ouvir, fui invadida por um sentimento de Paz, como se finalmente, tivesse conseguido libertar-me da amarra do meu passado.
Quando terminamos a nossa conversa, olhei para o armário...
Pensei... para a próxima vou tentar não adiar tanto tempo o inadiável,
que se traduz em não adiar a vida...
Foto: Digital Vision