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Ontem recordei os meus tempos de filha única, que fui até bastante tarde.
As intermináveis férias no Alvor, nas mil e uma invenções que criava para afastar o tédio, que era ser sozinha no mundo dos adultos.
Fartei-me de rir de mim, ao recordar que para passar o tempo, me perdia.
Enfiava-me numa mata perto de casa, ía a correr, tapava os olhos, rodopeava e quando destapava os olhos, pensava... perdi-me! Fixe! Depois andava por ali, horas ou minutos, que naquela idade o tempo passa muito devagar...
Lembro-me das explorações que planeava, dos meus piqueniques sozinha, debaixo de uma árvore enorme que me deslumbrava, imaginava-a muito velha, que à sua sombra já se teriam sentado muitas pessoas, todas elas acompanhadas, pensava eu, a maior abandonada do mundo! O piquenique resumia-se a algumas peças de frutas e chocolates que ía guardando para a ocasião. Sempre de livro em punho, na altura lia afincadamente a colecção de livros "Uma Aventura". Tinha uma inveja daqueles putos e das gémeas, sempre a passarem fins-de-semana fora ou férias aqui ou ali. Para onde iam, tudo era uma Aventura! Pensava então no que poderia fazer sozinha para tornar as minhas intermináveis férias numa Aventura, já não digo igual, mas pelo menos com alguma emoção... conhecia a zona que circundava a casa, como conheço as palmas da minha mão. Quando deixei de me poder perder na mata, porque já a conhecia, comecei então a "perder-me" pela vida, ainda tão desconhecida. Curioso que hoje quando parto para uma qualquer "aventura", jamais tapo olhos e rodopio para me perder. Certo é (dizem) que com a idade vamos aprendendo algumas coisas, vamos sendo cautelosos... esquecem-se de dizer para não desaprendermos a emoção que é perder-nos e sentir sem medo o prazer de só sentir...
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